O centroavante

12/09/2020

Aquele era um dia especial. O primeiro domingo de Marcos depois da recuperação da fratura na perna. Entraria em campo novamente no campeonato amador, diante do principal time da cidade, o União. Dois craques jogavam lá, diziam até que eles tinham sido profissionais, Serginho o zagueiro, e Bigode o centroavante. Juntos eles já tinham desbancados todos os bons adversários da cidade, Serginho que de pequeno não tinha nada, trucidava os atacantes, enquanto Bigode empurrava para as redes.

Aquele era mesmo um jogo especial para Marcos, quando ele quebrou a perna, num acidente de moto, Larissa era sua noiva. Estavam prontos para casar, mas aquele acidente tirou-o de circulação, e ela não aguentou os mais de sete meses de repouso, e foi se consolar nos braços de Serginho. Não que ele estivesse com vontade de se vingar, mas humilhar o homem que roubou a sua mulher é sempre uma boa forma de aumentar a alto estima.

Enfim a tarde chegou, Marcos estava nervoso, o treinador que por sinal era também o patrão na fabrica, escalou o time, e jogou a camisa 17 para o atacante, na hora ele entendeu: estava na reserva.

O jogo começou, Serginho era soberano na zaga. Bigode já tinha tido duas oportunidades, e logo pintou a terceira, jogada de linha de fundo, bola na área, o centroavante pulou e pimba, um a zero.

No final do primeiro tempo eis que o próprio Serginho avançou de trás do meio campo, Marcos tinha que reconhecer, foi um golaço, dois a zero.
Segundo tempo de volta. Marcos pediu para entrar, foi atendido, quando ainda aguardava na beira do gramado olhou para a cerca e lá estava a bela Larissa, gritando como uma louca para Serginho, que olhava e ria.

Eis que Marcos tocou na bola uma vez, deixou dois marcadores na saudade, corte rápido, ele estava como antes, ia fazer o gol, mas sentiu-se atingido por um caminhão, era Serginho, que lhe arrancou a bola e foi se embora. Ele olhou para a cerca e lá estava ela vibrando como uma Maria Chuteira no quarto de Renato Gaúcho.

Nova chance, Marcos arrancou, cortou o primeiro, dividiu com o segundo, bola picando, olho na pelota, toque por cima do terceiro marcador, goleiro saindo desesperado, mais um toque na bola, goleiro na saudade, e bola na rede. Golaço para lembrar e contar para os netinhos o resto da vida.

Jogo quase no fim, contra-ataque veloz, bola no Marcos, toque com o pé direito, pedalada por cima da bola, elástico no marcador, opa espera aí, era o Serginho ficou para trás, o goleiro surge na frente, toque no canto, gol de novo.

Empate! Aquilo era incrível, dois golaços, Bigode de cabeça baixa no ataque, Serginho abatido na zaga e Marcos festejado pela torcida. Os adversários o cumprimentavam, os companheiros, o agradeciam. Voltou a olhar para Larissa, ela riu de volta. O grande Marcos estava novamente, mais rápido que antes, mais mortal do que antes.

Pegou a moto e saiu feliz da vida, dobrou uma esquina, um carro de encontro, batida forte, ambulância, Samu, Policia, e o veredicto, Marcos tinha fraturado a perna em dois lugares, mais um ano de molho.
O mundo gira, e tudo muda, a como muda.